Califórnia 2017 – parte II – Lover’s Leap
Após a escalada do Mount Whitney, Rogério, Nathália e eu seguimos para Yosemite para mais uns dias de escaladas tradicionais no vale. Clima bom, facilidade de locomoção e tudo o que se pode desejar de um dos melhores parques nacionais americanos, que é Meca da escalada mundial.
Na sequencia, o Rogério e Nathália seguiram em viagem para o Napa Valley e eu encontrei com a Ana para mais uma etapa da viagem, que tinha o Half Dome e o The Incredible Hulk na lista de objetivos.
Optamos pelo Half Dome por ser uma escalada mais dura e um aprendizado a mais para a Ana. Num papo com o Nick Martinez, ele nos avisou de que uma parte da via havia desmoronado, e que a seção estava mais complicada para passar, exigindo escalar em artificial. Como estávamos despreparados para este contratempo, tivemos que comprar uns cliffs para o artificial, preparamos comida para 3 dias, e planejamos a escalada com um pernoite na base da via, e outro da 17° enfiada. A previsão do tempo era favorável, prevendo 4 dias de tempo limpo e sem chuva. Bora!
Acordamos cedo e partimos ladeira acima. Há duas alternativas para acessar a base da Northwest Regular: via aderências em frente da parede (bem perigosas se você estiver pesado), ou pela trilha para a subida da via ferrata. Optamos pelo caminho mais seguro, que tem 11km de extensão, mas que aos 6km, há um rio onde poderíamos captar a água para os dias na parede.
O dia foi avançando e quanto mais subíamos, mais frio ficava. Um frio cortante que nos forçava usar agasalho mesmo expostos ao sol e caminhando com peso.
Ao chegarmos na parede, encontramos um escalador americano que nos avisou ter uma cordada na parede, e que estes, estavam tendo dificuldade para passar o trecho da 11ª. enfiada. Justamente a seção que desmoronara! Avançamos até um bloco de pedra de onde tínhamos a visão da parede e da dupla que estava na via. Mais ninguém na montanha. Ponderamos sobre o frio, sobre o problema da seção e bateu um desânimo. Decidimos voltar. Frustração, choro engolido, droga, droga, droga… mas sentíamos algo estranho e era melhor prestar atenção. A descida foi triste. Triste até quase chegarmos a Happy Isles. Ali, começou uma chuva fina. Pensamos: ainda bem que não ficamos lá em cima, pois iríamos tomar uma bela chuva naquela noite. Comemos pizza, bebemos cervejas, e fomos para o Camp 4. Naquela noite choveu muito, mas muito mesmo. O Camp 4 ficou inundado. Tivemos pena da cordada que estava na parede. Pensamos em secar umas coisas e depois tirar o dia de descanso para as pernas. Isso até sairmos do bosque onde fica o Camp 4 e olharmos as montanhas. Estava tudo nevado, já abaixo da cota de altitude do Half Dome. Meu! Por pouco nos nos ferramos. A previsão errou feio, mas a nossa intuição, não.
A frustração do dia anterior deu lugar a alívio, por não termos entrado numa grande roubada. Tomamos café, preparamos as tralhas e mudamos os planos para o The Incredible Hulk, que fica do outro lado da Sierra Nevada. Ao passar por Tuolumne Meadows, passamos por muita neve e tempestades fortes, que nos acompanharam até Mammoth Lakes. Novamente olhamos a previsão, que profetizava clima ensolarado dali a três dias.
Fizemos passeios de consolação, fomos para Buttermilks, tomamos mais cervejas, comemos muita comida mexicana e no terceiro dia estávamos em Bridgeport para ver as condições para o Hulk. “No way, dude!” Disse o porteiro do camping em que iríamos deixar o carro para subir para a montanha. A neve estava alta demais, cerca de 50cm. Isso indicava que as fendas por onde deveríamos escalar e proteger, também estavam entupidas de neve. Era bem pouco provável que conseguíssemos escalar lá nas próximas duas semanas, pois depois de a neve descongelar, a montanha ficaria escorrendo água por mais vários dias. Deu vontade de chorar. Por que? Por que?
Ok. Sem outra opção, pensamos em outro objetivo. Lembrei-me de Lover’s Leap. Falei com o mago Nick novamente e ele nos recomendou o pico. Partimos para lá e nos demos finalmente bem.
Lover’s Leap é uma gigantesca falésia que fica bem perto de Lake Tahoe, próximo da divisa de Nevada. A grande maioria das vias seguem as fendas verticais que riscam a parede e são em geral, seguras. Para as vias que escalamos, dois jogos de friends e pelo menos um de nuts são obrigatórios, melhor levar dois. Nos Phanton Spires, um lugar bem próximo com blocos fendados de 30m a 50m eu me dei mal levando apenas um jogo de cada peça e tive de descer de duas vias.
Em Lover’s Leap as rotas tem em média 4 ou 5 enfiadas. Leve fitas grandes para as bases. Nenhuma das que paramos tinha grampos. Treine a montagem rápida de bases móveis, ou vai escalar pouco por lá. Não rolas de rapelar as rotas, você tem que chegar ao topo e descer por trilha. Então fique atento ao clima e ao grau das rotas, ou terá de abandonar equipamento móvel para descer.
Há um camping bem perto da falésia, que tem banheiros, mas não tem chuveiro. A cerca de 1km, colado na rodovia, há o Strawberry Lodge onde rolas tomar banho e um Mountain Shop bem equipado onde você pode (no horário comercial), comprar alguns itens de primeira necessidade que precise, além do guia de escaladas do local. A cidade mais próxima com supermercado, gasolina, restaurantes é Lake Tahoe, que dista uns 20km. Então fica a dica para que você vá pra lá o melhor abastecido possível.
Gastamos 3 dias em Lover’s Leap e Phanton Spires. Não foi o que planejamos, mas foi o que havia disponível no momento. A Ana curtiu bastante e guiou várias vias em móvel, e esse aprendizado é muito importante, então a trip foi um sucesso.
ThanX: SOLO mountain wear, DEUTER mochilas e sacos de dormir, CAMELBACK garrafas e sistemas de hidratação, SPOT BRASIL sistemas de telefonia e sinalização satelital.
Eliseu Frechou
Guia de montanha e instrutor de escalada. Iniciou no esporte em 1983 e desde então se dedica ao montanhismo e à escalada tempo integral atuando em diversos segmentos, mas principalmente na organização de expedições, produção de documentários e filmes.
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