Agulhas del Frey – Escaladas na Patagônia argentina

Agulhas del Frey – Escaladas na Patagônia argentina

Três dias após retornar da Chapada Diamantina, com um calor constante de 40°C, encontro com o Rogério Jorge em São Paulo e partimos para a as Agulhas do Frey em Bariloche, Argentina.

Não foi minha primeira vez no lugar. Foi a terceira. Na primeira, fui fazer a caminhada com meus filhos, na segunda que foi em outubro de 2015, Ana e eu ficamos 4 dias na barraca por conta do mal tempo e apesar de no quinto tenhamos conseguido fazer a Sifuentes-Weber-Montis na agulha Frey, o sexto dia iniciou quente de uma forma que derreteu tanto o gelo que tornou a caminhada de aproximação muito desagradável, a ponto de juntarmos as tralhas e irmos para Piedra Parada.

Caminhada de aproximação, pela trilha que segue a aresta do cume do Cerro Catedral.

Caminhada de aproximação, pela trilha que segue a aresta do cume do Cerro Catedral.

Neste mês, tivemos melhor sorte. A estratégia para ficar pouco tempo e mesmo assim aproveitarmos, foi ir de teleférico até Ponta Princesa, um dos cumes do Cerro Catedral, e daí apenas descer rumo ao Refúgio Frey. Neste rolê, você vai ver um visual que não terá subindo do outro lado. Poderá ver o lago Nahuel Huapi, e o Cerro Tronador e outras montanhas do Chile. A outra opção é fazer a caminhada a partir da estação de esqui, que além de mais longa, é subida. Uma longa subida que se torna bem desagradável quando você carrega quase 30kg de equipamentos na cargueira.

Virando a crista do Catedral, com a laguma Schmoll em frente.

Virando a crista do Catedral, com a laguma Schmoll em frente.

Este primeiro dia de aproximação foi de chuva, granizo e neve. Fizemos o rolê em menos de 4 horas, fazendo imagens, parando quando o granizo aumentava de intensidade e chegamos no refúgio no meio da tarde. Conseguimos dormir as duas primeiras noites no abrigo, mas é necessário fazer reserva no site do Clube Andino Bariloche http://refugiofreybariloche.com/ e pagar por esta facilidade. Camping é grátis, mas também precisa reservar, pois há lotação. Ficamos acampados 3 noites. Para quem não vai usar o refúgio para dormir, há a possibilidade de pagar a parte o uso da cozinha (200 pesos/pessoa), e assim não carregar fogareiro e panelas para cima. A estrutura da cozinha é OK se não tiver muita gente no lugar. Alguns dias tivemos que esperar bastante para usar o fogão e sentar na mesa. Existe banheiro (mas não banho) e o uso é livre.

Rogério no interior do abrigo.

Rogério no interior do abrigo.

Refúgio Emilio Frey.

Refúgio Emilio Frey. Laguna Toncek e agulha Principal ao fundo.

O dia seguinte foi de muito frio. Escalamos a via “del Diedro” na agulha M2 tendo que parar para aquecer as mãos, pois já não conseguíamos abrir os mosquetões de tão congeladas que estavam. A via é sensacional. Bem protegida e com base dupla para rapel. Teríamos feito outras rotas se estivesse mais quente. Voltamos para o refúgio e na parte da tarde, o Rogério guiou o “Diedro de Jim” e eu fiquei com a “Fissura de Jim” na Agulha Frey. Duas pequenas enfiadas espetaculares que com certeza, são as vias mais repetidas do lugar. Levamos 2 cordas e da base que fica no final da fissura, um rapel nos pôs no chão.

Agulha M2.

Agulha M2.

Rogério guiando o "Diedro de Jim".

Rogério guiando o “Diedro de Jim”.

Segunda enfiada, a "Fissura de Jim".

Segunda enfiada, a “Fissura de Jim”. O refúgio ao fundo, a direita da laguna, com algumas barracas ao lado.

O terceiro dia foi de calmaria no vento e resolvemos esticar 4 enfiadas na “Sifuentes-Weber”, emendando na última e alucinante enfiada da “Sifuentes-Montis”. Esta via fica exatamente em frente ao refúgio e por ser bem frequentada, a rocha está bem polida, o que dá a sensação do grau ser bem mais alto que o 5+ sugerido no croqui. O rapel é pelo “Diedro de Jim”, e uma corda de 60m é suficiente. Neste dia preferimos descansar para mandar a “agulha grandona” no dia seguinte.

Cume da Agulha Frey.

Cume da Agulha Frey.

Ana em 2015, na mesma "Sifuentes-Weber-Montis". Muita neve e frio.

Ana em 2015, na mesma “Sifuentes-Weber-Montis”. Condições alpinas com muita neve e frio.

Neste dia encontramos uma trinca paulista formada pelo Luizão Brinco, o Douglas e o Arthur Sponchiado, que haviam acabado de chegar da caminhada. O trio curtiu a ideia de subirmos juntos para a Agulha Principal e escolhemos a mesma via “Clemensó” na face maior, para chegar ao cume principal (a montanha tem 2 cumes). A “Princi” fica no final do vale, bem acima das outras agulhas, e a aproximação nos tomou mais de uma hora e meia piramba acima. Como estamos bem acostumados com o ambiente alpino, conseguimos ler os sinais e navegar na via sem grandes dificuldades. O croqui é baseado em traços em cima de fotos, o que pode ser bem difícil de se orientar dependendo de onde se está, luz do dia e se a parede tem muitas opções. Decifrar o melhor e mais seguro caminho para não entrar numa armadilha é uma técnica que tem de ser adquirida em paredes menores e com croquis mais bem detalhados, antes de entrar numa parede como a Principal. Como disse, não tivemos problemas, mas alguém mais indeciso com certeza terá momentos de não saber para onde seguir. Após a enfiada que considerei a mais difícil, logo abaixo do lance artificial (considerado o crux original da via), tivemos dúvida de por onde seguir. O Rogério saiu guiando e passou em chaminé, a esquerda do artificial e quase na borda da grande laca, costurando um cam #4 logo após a última cunha de madeira e após uma saída bem esquisita, passou facilmente por este trecho.

La "Princi". A Clemensó começa no centro da parede, segue em direção à aresta esquerda e volta para o centro para fazer cume pela via "Normal".

La “Princi”. A via “Clemensó” começa no centro da parede, segue em direção à aresta esquerda e volta para o centro para fazer cume pela via “Normal”.

Eliseu Frechou

Rogério guiando a quarta enfiada.

Eliseu Frechou

Rogério na chaminé. O antigo artificial é pela fissura da esquerda.

Depois dessa enfiada, a “Clemensó” se une à “Normal” em mais uma enfiada até o cume. O cume é bem pequeno e tivemos que nos revezar com o Luiz, Douglas e Arthur.

A “Clemensó” transcorre por fendas o tempo todo, com exceção da última enfiada que é um 6°sup de agarras, protegido por chapeletas e pitons. No restante da parede, não há grampeação. Levamos 2 jogos de cams, 1 jogo de nuts e micro-cams (leve, pois na enfiada crux você vai usar). Dá para escalar e rapelar com uma corda de 60m. Em nenhum momento precisamos de unir cordas para rapelar pela via “Normal”. Isso ajuda a economizar peso, mas é apenas uma sugestão. Muita gente prefere usar cordas duplas ou gêmeas. Eu as considero caras e desnecessárias na maioria das vezes. Prefiro levar uma retinida super fina para recuperar a principal nos rapéis mais longos. Nesta viagem, as vezes que levamos a retinida, a levamos para passear, não a usando sequer uma vez.

Luizão na última enfiada.

Luizão na última enfiada.

Luizão na última enfiada.

Rogério no rapel da “Normal”.

Time brazuca no final da escalada.

Time brazuca no final da escalada. Rogério, Arthur, Douglas, Luiz e eu.

No dia seguinte fomos à agulha Abuelo estávamos cansados, mas preferimos ir escalar, já que o clima continuava excelente. Escalamos o que deveria ser a “Ñaca ñaca crunch crunch”, mas devido a infinidade de fendas e pouco detalhamento da imagem do croqui, não sabemos ao certo se seguimos corretamente a linha da rota. Mas como o terreno é fácil, subimos de buenas e rapelamos 30m de uma base que fica para o lado da Perfil de Mujer. Linda via em rocha com boa aderência e com muitas opções de proteção.

Eu, na última enfiada da “Ñaca ñaca crunch crunch”.

Eu, na última enfiada da “Ñaca ñaca crunch crunch”.

Dicas

Minha dica para quem vai pela primeira vez ao Frey é antes de tudo, se ambientar antes de entrar nas vias difíceis. Vá de buenas, conheça a rocha, escale abaixo do seu limite e escale todos os dias sem precisar descansar. “Quem tudo quer, nada tem”.

Ao chegar no aeroporto, use o serviço de taxi (650 pesos para até 3 pessoas até o centro). É mais barato que as vans (600 pesos por pessoa).

Bariloche é uma cidade cara. Há diferença de preços nos comércios que ficam na região mais central e atendem turistas, dos que estão um pouco mais afastados. Há boas opções de mercados e lojas de equipamentos (preços salgados em relação ao Brasil), que oferecem mais roupas do que equipo técnico. Nas lojas de equipamentos você consegue comprar o Guia de Escaladas Frey e Catedral.

Para ir ao Frey, você pode usar ônibus (necessário comprar o cartão com créditos) ou taxi (650-700 pesos).

Hotel custa em média U$50/diária para duas pessoas. Refeição, calcule de 600 a 800 pesos. O chope artesanal nas cervejarias locais custa de 90 a 130 pesos o pint 🙂

Refúgio Frey.

Refúgio Frey.

 

Eliseu Frechou

Eliseu Frechou

Guia de montanha e instrutor de escalada. Iniciou no esporte em 1983 e desde então se dedica ao montanhismo e à escalada tempo integral atuando em diversos segmentos, mas principalmente na organização de expedições, produção de documentários e filmes.


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