Quais substâncias podem danificar minha corda?
Dúvida comum de todo novato da escalada é sobre como cuidar da corda, um equipamento bem caro e que é literalmente arrastado montanha acima, agarrando pelo caminho todo tipo de sujeira, desde as que você pode se livrar com um simples chacoalhar, as que precisam de lavagem, e as que podem lhe causar um certo estrago no bolso, forçando-o a aposentar sua corda prematuramente, antes que você possa ir parar num hospital ou no cemitério.
Lavar uma corda é fácil. Se a sua corda tiver alma soldada à capa, basta lavar na máquina de lavar (não aqueles tanquinhos, que são muito agressivos), apenas com água e sabão de coco. Jamais use detergente. No mesmo banho, podem entrar fitas e cadeirinhas. Deixe secar a sombra, processo que demora um dia ou dois.
Para nossa infelicidade, existem diversas substâncias próximas de nosso ambiente de escalada que afetam sua corda permanentemente, e que devem receber atenção especial. Isso não é novidade se você fez um curso básico descente. Mas algumas práticas podem causar tanto estrago no seu equipamento quanto se você morar num lugar quente e deixá-la armazenada no porta-malas do carro num calor de 40°C por um mês inteiro.
O alerta soou nos Estados Unidos em 2012, quando uma corda se rompeu ao segurar uma pequena queda em um ginásio. Após uma investigação digna dos seriados C.S.I., descobriu-se que a corda, ao ser deixada por instantes no chão do estacionamento do ginásio, havia sido contaminada com ácido sulfúrico, que é usado em baterias de carro! O escalador dono da corda, que a havia comprado há apenas 4 anos, e portanto dentro do prazo de “validade”, disse que a capa da corda demonstrou uma pequena descoloração na área contaminada, mas ele a confundiu a marca com sujeira de carbonato de magnésio.
Iniciou-se então uma pesquisa para conhecer os efeitos dos ácidos que usamos no dia-a-dia sobre nossas linhas de vida.
Cordas de escalada são feitas a partir de poliamida (um tipo específico de nylon). E é bem conhecido que poliamida pode ser severamente degradada após uma, mesmo que breve, exposição a ácidos fortes. Possíveis fontes de ácidos são baterias de carro ou de certos produtos domésticos, tais como produtos de limpeza mais fortes, usados para desinfecção de banheiros (água sanitária), pisos ou limpeza de fogões.
Agora uma nota não imaginável: De acordo com o fabricante da Honeywell, que fabrica a poliamida usada na maioria das cordas de escalada atualmente no mercado, óleo de motor, óleo mineral, água salgada, gasolina, querosene, benzeno, clorofórmio, tintas, óleos de pinho e repelente de insetos não afetam este tipo de nylon! Segundo a fabricante, os agentes que irão enfraquecer o nylon são os ácidos e os solventes.
Nota da Blue Water Ropes: “Testing done indicates salt water, acetone, benzene, chloroform, freon, gasoline, kerosene, motor oil, mineral oil, paints and pine oil do not appreciably affect nylon and should not damage your rope. Laboratory tests performed have shown no appreciable damage done to nylon fibers by contact with insect repellents containing DEET (Test #0559).”
Nota da Sterling Ropes: “What chemicals are bad for my rope? It is best to assume that all chemicals are bad for your rope. Do not expose your nylon or polyester ropes to chemicals. That said, much recent data has been collected regarding how substances affect rope life. Data available from Honeywell Corporation (makers of nylon 6, polyester and Spectra®) shows that nylon’s strength is not greatly affected by motor oil, mineral oil, salt water, Freon, gasoline, kerosene, benzene, chloroform, paints, pine oils, or insect repellents containing DEET. Chemicals that should be avoided at all costs are bleach and sulfuric acid. Still even with this reassurance it is best to protect your rope from any exposure to any acids or alkalis and to store your rope in a cool dry environment.”
https://outdoors.stackexchange.com/questions/1635/things-to-keep-away-from-climbing-ropes
Como regra, qualquer coisa que você possa colocar na sua pele que não a queima é OK para a sua corda.
Há também outro ácido que é uma presença constante em nossas mochilas de escalada: o ácido das baterias, sejam as de níquel-cádmio ou as alcalinas. Mantenha sua headlamp ou furadeira em compartimentos separados ou mesmo fora da mochila.
Outra preocupação é com relação à urina. Tanto a urina humana quanto a animal, diminuem a resistência da corda. E esta redução pode chegar a 30%, o que é considerável e digno de cuidado. Escaladores de grandes paredes tem que tomar um cuidado especial com suas necessidades fisiológicas serem realizadas longe dos materiais de poliamida. Mesmo sem termos testes para provar, é previsível que aconteça a mesma redução de carga com as fitas e cadeirinhas que receberem respingos de urina. Tome cuidado com seu gato ou cachorro também, caso seu companheiro goste de dormir em cima da sua mochila de equipamentos.
Este artigo é baseado na minha pesquisa sobre o assunto, e não é um ponto final em tudo o que se sabe atualmente – e ainda há muito sobre o assunto a ser pesquisado. Uma situação é mergulhar a corda numa privada e depois testá-la, outra é saber se o vapor das centenas de substâncias que eventualmente podemos encontrar na nossa casa, armário ou na natureza, podem afetar de maneira significativa nossos equipamentos – e nossas vidas.
Eliseu Frechou
Guia de montanha e instrutor de escalada. Iniciou no esporte em 1983 e desde então se dedica ao montanhismo e à escalada tempo integral atuando em diversos segmentos, mas principalmente na organização de expedições, produção de documentários e filmes.
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Boa Eliseu, obrigado pelo texto.
Minha dúvida é: tenho minha corda a 11 anos (Beal) uso pouco e armazeno adequadamente, e sempre que uso faço uma inspeção minuciosa. Ela não apresenta nenhum ponto “duvidoso”, mas tenho dúvidas se não tenho que aposenta-lá somente pelo tempo. O que acha?
Oi Marcelo,
Como qualquer “plástico”, as poliamidas deterioram naturalmente pelo simples fato de existirem, e o prazo máximo é de 10 anos, sendo que eu não aconselharia usar uma corda com mais de 8 anos para guiar.
Bom dia, Eliseu. Respingou cal que estava usando para pintar uma parede numa corda minha… Passei um paninho nela pra tirar e tal mas nunca mais usei, tá parada. Esse dias, passando a corda, não consegui identificar o ponto onde respingou e nada diferente na textura dela…. Mas nao tenho coragem de usar. Vc sabe se a cal é prejudicial à corda?
Oi Thiago, segundo as informações dos fabricantes, não há problema, se você limpou na hora e sequer consegue identificar onde o cal teve contato com a corda.
Ok, obrigado Eliseu!