Escalada da Pedra Riscada

Escalada da Pedra Riscada
Riscada e Filhote

Riscada e Filhote

Escalar a Pedra Riscada, definitivamente, não é tarefa fácil. Na semana passada estive em São José do Divino pela terceira vez com esta missão, desta vez com o Michel Abdelnur, e novamente suei a camisa para atingir o topo.
Mesmo pela via Bodífera Ilha, considerada a “normal” da montanha, são vários os fatores que transformam esta escalada numa pequena aventura. As distâncias, na minha opinião, é o que mais impressiona e pesa.
Saímos da casa na quinta-feira de madrugada e só chegamos em São José do Divino ao entardecer, rodando 970km de estradas nem sempre boas. Lá, encontramos o Edimilson Duarte e logo pela manhã da sexta-feira partimos pelos 30 km de terra em direção da Riscada. O Edimilson tem um abrigo (http://recantopedrariscadamg.blogspot.com) excelente, bem próximo das paredes, e sua infra-estrutura é essencial para quem quer ficar um tempo na área.
Assim que chegamos, passamos rapidamente pelo abrigo e seguimos para a parede. A estrada que leva até a casa do Silveira, uns 4km deste a abrigo, está destruída. Vários atoleiros que mesmo não parando o carro, detonam bastante, além do mato que literalmente dominou a estrada e arranhava cada vez mais a nossa barca. Tivemos que parar o carro e seguir a pé os últimos 3 km

Primeira base

Primeira base

Na casa do Silveira, já atrasados, resolvemos alugar os serviços da mula do camarada para levar as mochilas até o ponto mais próximo da parede que ela conseguisse. Foi uma ajuda e tanto, que nos possibilitou entrar no horário previsto de iniciar a escalada antes das 11h00.
Nossa estratégia era de, o guia levar uma mochila leve e o segundo uma mais pesada, subindo jumareando para agilizar o trabalho. A primeira enfiada é tranquila, III grau, com apenas uma chapeleta na metade dos 50m. Isso é é bom para aclimatar o escalador, pois outra característica desta rota dos mineiros Eduardo “Ralf” Azevedo e Emerson Azeredo, é a exposição. A segunda enfiada é um pouco mais protegida, com dois grampos logo na saída e uma costura em árvore, depois um esticão de 30m em terreno fácil.

Partindo para a segunda enfiada

Partindo para a segunda enfiada

A terceira enfiada é o crux psicológico do dia. É uma enfiada de IVsup com 60m, com uma costura em árvore logo na saída e depois sem nenhuma outra possibilidade de proteção. Tudo bem, é fácil. Vou fingindo que está tudo tranquilo e minutos depois acho as duas chapeletas da base, meio camuflada, mas como guiei este trecho nas duas primeiras vezes que estive lá, lembrei de uma mancha de rocha cinza logo a esquerda da parada me orienta. Mais um trecho de 35m até uma árvore, e finalizamos a parte técnica. Daqui pra frente é só caminhada.

Linha aproximada das primeiras enfiadas

Linha aproximada das primeiras enfiadas

As primeiras enfiadas

As primeiras enfiadas

 

Retiramos as cadeirinhas e guardamos as cordas. Tomamos uns goles de água (que já está no final) e seguimos rápido em direção ao bivaque, ainda distante umas 2 horas. A dica para quem vai fazer esta via é sempre que possível, ir beirando a parte direita da montanha, evitando entrar na floresta que está na crista, pois o avanço na mata é lento, com urtigas, muitos espinhos e vegetação fechada. O empecilho de andar pela borda é que você estará perto dos abismos, então toda atenção é pouca.

 

Michel nos platôs

Michel nos platôs

Logo após a base da árvore, subimos em direção de arvorezinhas um pouco maiores a direita e logo o caminho vai estreitando e beirando uns blocos de pedra de 5 metros, logo após estes blocos, buscamos um caminho para subir até a crista. Neste trecho da crista, os bodes que vivem na montanha – isso mesmo, bodes – mantém um pequeno caminho limpo. Seguindo a trilha dos bodes, saímos deste braço da montanha para chegar no trecho mais amplo da Riscada.

Esta montanha parece uma colomba pascal, com braços para todos os lados. A via que estamos fazendo começa por um destes braços, contornando a montanha em travessia até achar linhas mais naturais para ascender. Ótima estratégia dos conquistadores.
E assim, vamos ganhando altura aos poucos, com um visual alucinante, até alcançarmos o platô do bivaque, onde felizmente encontramos as cacimbas cheias de água e pudemos nos abastecer para continuarmos a escalada. Como por questão de peso não levamos mais que 1 litro de água, contamos com este reabastecimento para termos autonomia para o restante da escalada.

 

Michel na cacimba de água. Ao fundo a direita, o platô do bivaque

Michel na cacimba de água. Ao fundo a direita, o platô do bivaque

Arrumamos o bivaque e para nossa sorte, a noite foi excepcionalmente quente. Um céu cheio de estrelas e a luz da lua muito forte deu-nos um presente sem igual. Fomos dormir cedo para restaurarmos as energias para o segundo dia da maratona.

Noite estrelada.

Noite estrelada.

SEGUNDO DIA

A manhã do segundo dia clareou antes das 05h30 e nos tirou do saco de dormir a frente do despertar dos relógios. O equipamento já estava pronto e seguimos rápido para a segunda parte da nossa tarefa.

Nascer do sol

Nascer do sol

Logo após cruzar as cacimbas, o terreno é fácil, após a passagem de uma canaleta, começa a ficar mais vertical e muitas vezes precisamos usar as mãos, mas por mais de 200m ainda seguimos de botas, e só no terceiro grupo de árvores é que colocamos as sapatilhas. A via vai seguindo em travessia e subindo aos poucos, alguns platôs com árvores servem como costura, e assim vamos subindo em simultâneo para ganhar tempo.

Saindo do platô do bivaque

Saindo do platô do bivaque

Depois do terceiro grupo de árvores após a canaleta, colocamos a sapatilha e sigo em direção ao platô seguinte, 70 metros à frente. Nesta enfiada há duas chapeletas. Mesmo levando cordas de 60 metros, você precisa parar na segunda chapeleta para que o seu companheiro suba até a primeira e lhe faça segurança e você consiga ter corda suficiente para atingir o próximo platô.

Em algumas travessias é necessário sapatilha

Em algumas travessias é necessário sapatilha

Mais um trecho tranquilo de 50 metros e a sapatilha é necessária novamente. Faça a base numa árvore e suba em direção ao platô 80 metros acima. O primeiro grampo desta enfiada está a 30 metros da árvore, depois você costura outro grampo e encontra a base. A enfiada seguinte é curta e sem proteção. Deste platô/cume gigante, que segue até onde terminam as vias da aresta (Place of hapiness e Aonde o vento faz a curva) para o cume são mais um trepa mato e mais uma enfiada e meia. Do alto destas duas enfiadas não rolas visual, pois o mato é fechado demais. Fiquei bem frustrado quando, na segunda vez, subi com a Fernanda Rocha e o Fernando Leal, dei a pernada pelo mato e não consegui ver nada… Nenhum cocuruto sequer para ter uma visão 360°. Ficamos então no final do trecho de pedra, evitando assim a caminhada pelo mato, curtindo um pouco mais o visual – e tentando prever o que aconteceria com o clima que já estava fechando. Pensamos o quanto seria difícil descer as aderências se elas ficassem molhadas e descemos rapidamente.

Rapelando no fog

Rapelando no fog

Chegamos ao bivaque as 10h15 e no carro antes das 13h00. Seguimos pelas estradas que circundam a Riscada até São José do Divino. Resolvemos ir puxando o máximo que desse e acabamos, depois de muitos cafés, um rodízio e várias cocas, batendo em São Bento do Sapucaí as 05h00, com quase 24 horas de atividade ininterrupta. A escalada acabou virando maratona. Mas é disso que a gente gosta mesmo! Ahahahaha.

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Descarregue o croqui em alta no link: http://www.eliseufrechou.com.br/riscada.html


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